Como o uso de algoritmos usado por plataformas digitais restringem o acesso à informação

Chegando em casa depois de um longo dia, tudo o que você quer é relaxar. Pegar o celular para conferir as redes sociais e ver o que rolou naquele dia. Lá está a foto do seu priminho fazendo careta, o lançamento de sua banda favorita ou a notícia de que um radar foi instalado na avenida em que passa todos os dias. Você já se perguntou como todas essas informações chegam até você?

Quando realiza suas atualizações, o Facebook, por exemplo, preza por conectar o usuário às histórias mais relevantes para ele. Por meio de algoritmos — uma sequência finita de instruções bem definidas e não ambíguas —, as grandes plataformas digitais são capazes de personalizar conteúdo, exercendo uma espécie de curadoria da informação. 

A internet dos algoritmos vem mudando o modo como a sociedade consome informação e a sua percepção do mundo. Isso tem um papel positivo e prático em tempos de abundância informativa na rede, mas seus efeitos também preocupam. Ao criar algoritmos que selecionam, refinam e personalizam buscas de acordo com seu histórico de navegação, no caso do Google, ou que escolhem o conteúdo que deve ser mostrado ou não na sua timeline, a exemplo do Facebook, essas plataformas orientam e mediam o fluxo informativo na rede.

Os algoritmos melhoram a experiência do usuário, mas é preciso manter em mente que seu principal objetivo é econômico “Vale a máxima ‘Se você não está pagando por um produto, então o produto é você’. O algoritmo do Facebook prioriza o feed de notícias de familiares e amigos nas timelines. Marcas e veículos de comunicação precisam pagar mais para entregar conteúdo ao seu público-alvo. É um modelo de negócio, e não há problemas nisso. Mas é essencial que esse jogo de forças esteja muito claro para o usuário”.


“A personalização do conteúdo passa por um modelo que a maioria das plataformas que acessamos segue, o chamado Capitalismo de Vigilância. O termo, cunhado pela socióloga americana Shoshanna Zuboff, refere-se à prática de se coletar um volume massivo e constante de dados de cada usuário, para que seja construído seu perfil”, explica. “Esse perfil é tanto para a exibição de publicidade paga direcionada como de conteúdo que provavelmente esse usuário gostaria de ver”.

A curadoria da informação passa, então, a se basear nesse modelo. “Ela não tem como base a ética ou a veiculação de fatos, mas sim o objetivo de atrair a atenção do usuário. Quanto mais atenção, mais dados, mais aperfeiçoado o algoritmo se torna e mais personalizado o conteúdo fica. E quanto mais personalizado, mais lucro as empresas têm”, conclui.

Essa personalização coloca os usuários nas chamadas bolhas de filtro: um ecossistema virtual construído com base na exibição de conteúdo personalizado e que tem implicação direta em suas vidas. “A bolha não só apresenta o que gostamos, como também nos isola do que não gostamos. Isso deixa o usuário confortável por criar um mundo no qual tudo gira em torno dele mesmo”.



Efeitos pouco visíveis

Em um ranking produzido pela Quartz – agência norte-americana que divulga notícias sobre a nova economia global – o Brasil aparece em primeiro lugar entre os países que se informam prioritariamente pelo Facebook, com 67% de sua população. Os brasileiros também lideram a utilização do da rede social para fins diversos, com 80%.

“Cada vez mais, consome-se informação sobre tudo o que acontece no mundo pelas redes sociais. Há várias pesquisas recentes que mostram que, com a personalização feita pelos algoritmos, as pessoas consomem mais conteúdos que reforçam a sua visão de mundo e tendem a acreditar neles”, coloca a pesquisadora Fernanda. “Por isso, toda a discussão sobre pós-verdade e a proliferação de notícias falsas nas redes sociais faz sentido”.

Um estudo realizado no final de 2016 pela Universidade de Stanford mostrou que 40% dos jovens norte-americanos do Ensino médio e da graduação enfrentam dificuldades para diferenciar conteúdo jornalístico do patrocinado por anunciantes e para distinguir fontes de informação verdadeira das falsas nas redes sociais.

Mas há uma questão ainda pouco discutida no fato dessas plataformas terem se tornado a principal fonte de informação. Como aponta Veloso, “quando olhamos para os grandes veículos de mídia com um pensamento crítico, identificamos o posicionamento que aquele veículo reflete. Daí fica a pergunta: onde fica o editorial do Facebook?”.

Aprofundando-se ainda mais na questão dos algoritmos, o pesquisador acredita que nem os próprios funcionários que os criam são capazes de compreender como eles funcionam, pelo tamanho da complexidade que a fórmula adquire com o passar do tempo. “O problema não está na edição do que é ou não mostrado, mas sim na falta de transparência do que porque um conteúdo é ou não é mostrado. Temos ciência de que nossa realidade é construída por essas plataformas, mas não sabemos exatamente como pode trazer riscos a nossa liberdade de expressão e pensamento”.


Uso consciente

A melhor forma de furar as bolhas de filtro é estar consciente de sua existência. “Não esperar que o Facebook nos avise se uma notícia ou um fato é importante ou relevante já é um bom começo. Não podemos nos limitar a consumir informação por meio de redes de amigos e algoritmos. A curadoria jornalística que dá valor, contexto e agrega conhecimento à informação, tem um papel fundamental. Precisamos resgatar o valor do jornalismo para a sociedade”.

Já as plataformas digitais precisam ser mais transparentes quanto à maneira como orientam a seleção personalizada de informação. Dada a importância desses algoritmos, entender como as decisões são tomadas é uma forma de empoderar os cidadãos por meio do conhecimento e mostrar como por trás disso há um outro patamar, que não é claro e que tem uma influência gigantesca na vida social como um todo.
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